Texto integral da intervenção do Vice-Presidente do Governo, Sérgio Ávila, proferida hoje na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, sobre as Contas Públicas Regionais de 2014:
“A análise da Conta da Região de 2014 assegura, a esta distância temporal, uma abordagem mais estruturada, que permite assumir que o ano de 2014 pode ser hoje encarado como o ano em que se iniciou a trajetória de recuperação económica dos Açores, a qual se consolidou em 2015 como todos os indicadores económicos o evidenciam.
Na verdade – e em paralelo com os sinais de retoma que a atividade privada ia já evidenciando – a Conta da Região de 2014 reflete, também, a consolidação do objetivo alcançado no ano anterior, que visava assegurar que os Açores deixassem de ter qualquer impacto percentual no défice do país.
Como se sabe, desde 2013 que os Açores deixaram de ser um peso ou uma influência negativa nas contas públicas nacionais, conforme evidenciou o próprio Tribunal de Contas.
Este é, sem dúvida, o nosso principal património perante o país, ainda mais num momento em que se discute se Portugal deve ser penalizado por, no último ano, ter ultrapassado o limite de três por cento do défice imposto pela Comissão Europeia.
Sem querer entrar no debate de quem é a responsabilidade por esse incumprimento e se esse incumprimento deve ou não ser penalizado, uma coisa todos os Portugueses devem saber e todos os Açorianos podem afirmar: não existe nesse problema qualquer responsabilidade ou participação dos Açores.
Os Açores não contribuíram, em termos percentuais, para o défice do país, nem em 2013, nem em 2014, nem em 2015, e isso deve orgulhar todos os Açorianos que gostam da sua terra e a defendem.
Efetivamente, se, em 2010, o défice dos Açores se situava ainda nos três por cento do PIB regional, conseguimos reduzir para 2,2 por cento em 2012, voltar a baixar para 0,3 por cento em 2013 e reduzir ainda mais, para apenas 0,2 por cento do nosso nível de produção, em 2014.
Esta trajetória de consolidação das contas públicas, evidenciada por todas as entidades nacionais e internacionais, permite-nos hoje encarar com toda a tranquilidade este debate que domina o país.
Quando, em 2014, o país apresentou um défice de 7,2 por cento em relação do PIB, os Açores registaram apenas 0,00003 do PIB nacional.
Se tivermos em conta os correspondentes níveis de produção, verificamos que os Açores conseguiram um resultado 36 vezes melhor, face ao país, em 2014.
Este é o resultado da Conta da Região de 2014, apurado pelo INE, pelo Banco de Portugal e pelo Eurostat, e confirmado pelo Tribunal de Contas.
E é ainda mais relevante quando é apurado de acordo com o novo Sistema Europeu de Contas - SEC 2010, único critério contabilístico em vigor em toda a Europa, que engloba no perímetro orçamental os resultados das empresas do setor empresarial não mercantis, ou seja, além de toda a administração regional direta e indireta estão englobadas as contas dos três hospitais, da Saudaçor, da SPRHI, da Atlânticoline, da Ilhas Valor, da SDEA, da ATA e do IROA, entre outras entidades empresariais.
Cai assim, com estrondo, o argumento de que estas empresas permitiam desorçamentar a despesa ou compromissos e alteravam a análise da realidade financeira da Região.
Mais uma vez, não teve razão quem assumiu estas dúvidas.
Também em relação à dívida pública regional, o Sistema Europeu de Contas procedeu, através do INE, do Banco de Portugal e do Eurosat, à sua quantificação definitiva, que, englobando todas as empresas públicas que consolidam no perímetro da administração pública, representou no final de 2014 apenas 37 por cento do PIB regional – 1.404 milhões de euros – quando no país representava mais de 130 por cento do PIB e na Madeira era 118 por cento do correspondente PIB.
Ou seja, a dívida pública regional consolidada era, face ao correspondente nível de produção, cerca de quatro vezes inferior ao país e três vezes inferior à Madeira.
Mas, muito mais relevante do que a comparação com o resto país, é que, de acordo com o único critério contabilístico europeu, a dívida pública dos Açores, incluindo as empresas públicas classificadas, é cerca de metade do que aquela que a Europa pretende atingir daqui a 15 anos.
Esta realidade permite-nos afirmar, com clareza, que a Região tem uma margem muito confortável para assumir esta forma de financiamento como instrumento para continuar a dinamizar o desenvolvimento económico e social dos Açores.
Mais importante do que a análise destes dados em particular é contextualizá-la face às políticas implementadas pelo Governo dos Açores.
Os Açores demonstraram ao país, nestes anos, que era possível manter as contas públicas saudáveis sem fazer tábua rasa das políticas de apoio social, de apoio ao rendimento das famílias e das empresas e de manutenção, e mesmo reforço, dos níveis de investimento público.
Mais: os Açores mostraram ser possível manter uma trajetória de desenvolvimento sem onerar as gerações futuras, garantindo que em cada ano sejam disponibilizados e executados os recursos que permitem aumentar os apoios às famílias e às empresas açorianas.
É com satisfação que o Governo regista que o Tribunal de Contas, no seu relatório à Conta de 2014, tenha emitido um parecer favorável, sendo que as reservas e as recomendações apresentadas constituem para nós mais um estímulo ao constante aperfeiçoamento dos documentos apresentados.
É também relevante que o Tribunal de Contas também reconheça que estão ultrapassadas as duas principais recomendações relativas às contas anteriores, nomeadamente o enquadramento legal dos subsídios e da forma de apresentação da matéria na Conta, resultado do trabalho que o Governo tem vindo a desenvolver nos últimos anos tendo em vista o aperfeiçoamento da informação prestada e do alargamento da base legal dos subsídios a todas as áreas de intervenção.
Também é de salientar que as responsabilidades futuras com as parcerias público-privadas voltaram a registar uma redução em relação aos valores dos anos anteriores.
E é com agrado que o Governo vê reconhecido pelo Tribunal de Contas o valor de 582,9 milhões de euros, em 31 de dezembro de 2014, em contraposição com os anteriores 771,9 milhões, em 2013, e 846,1 milhões em 2012, dando razão à posição que sempre defendemos – de que estas parcerias não colocavam em causa as gerações futuras – e deitando por terra as contas, no mínimo estranhas, que outros fizeram no passado.
Retomo a ideia com que iniciei esta intervenção: em 2014, e apesar das dificuldades que ainda se faziam sentir na Região – a maior parte delas, é bom que se diga, impostas por uma austeridade externa – foi já possível identificar sinais de que a atividade económica começava a recuperar.
E recuperava, embora ainda timidamente em 2014, graças aos esforços do Governo dos Açores no sentido de não só manter, mas reforçar, os apoios às empresas, bem como à defesa intransigente que fizemos do equilíbrio dos orçamentos familiares, compensando, no limite das nossas possibilidades, os cortes de rendimento impostos aos trabalhadores.
Hoje, é já possível afirmar que o ano de 2015 foi ainda melhor, tendo-se caraterizado, de acordo com os indicadores estatísticos conhecidos, por uma clara retoma da atividade económica e da criação de emprego.
Tendo em conta todos os dados já divulgados pelo INE, no último ano os Açores registaram, efetivamente, uma recuperação do seu nível de produção e de rendimento, consolidando uma trajetória de crescimento económico e de emprego que foi até superior ao verificado no conjunto do país.
Aqui chegados, é o momento de fazer um balanço profundo sobre os efeitos da maior crise financeira dos últimos 70 anos que varreu a Europa e teve enormes repercussões na estabilidade financeira do nosso país.
Nos últimos seis anos assistimos em Portugal à rutura financeira do Estado, à rutura financeira da Madeira, ao colapso das principais instituições financeiras do nosso país – BES, BANIF, BPN e BPP, entre outros – e assistimos, ainda incrédulos, à necessidade de resgate da mais sólida instituição financeira do país, a CGD.
O Estado português, a Madeira e todas as instituições financeiras com capitais maioritariamente portugueses tiveram de ser resgatados e, na sequência desse resgate, foram impostos planos de ajustamento duros e com consequências nefastas para os portugueses.
No meio desta turbulência sistémica, apenas resistiu uma entidade: a Região Autónoma dos Açores.
É, pois, o momento de assumir esta evidência: os Açores foram a única Região do país que ultrapassou este período sem resgate, sem programa de ajustamento orçamental e sem serem impostas medidas que condicionassem a nossa Autonomia ou que penalizassem especificamente os Açorianos.
Resistimos! Os Açores e os Açorianos resistiram quando o Estado português, a Madeira e todos os bancos nacionais colapsaram!
Para a História ficará esta nossa pequena Região como o único exemplo de como foi possível manter, numa parte do território nacional, a solidez das finanças públicas e a nossa Autonomia, sem necessidade de resgates, de imposição de programas de ajustamento orçamental, nem de medidas restritivas próprias.
Mas não foi por mero acaso que os Açores foram a única região do país que não foi sujeita a qualquer processo ou programa de ajustamento orçamental e foram a parte do território nacional isenta de medidas restritivas ou de austeridade específicas.
E permitam-me que refira que o mérito desta realidade é única e exclusivamente dos Açorianos.
Dos Açorianos que, ao longo de 40 anos, souberam construir uma Autonomia responsável, uma Autonomia sólida, uma Autonomia solidária.
E esse mérito dos Açorianos deve ser partilhado com quem os Açorianos escolheram para os liderar ao longo deste período: Vasco Cordeiro, Carlos César, Alberto Madruga da Costa e João Bosco Mota Amaral.
Temos, pois, um património que é só nosso, que é de todos os Açorianos e de mais ninguém.
Não foi fácil, como é óbvio. E nem tudo aconteceu como desejávamos que tivesse acontecido, por vezes em virtude de falhas nossas – que humildemente admitimos – mas, em muitas ocasiões, por acrescidas dificuldades que foram sendo colocadas aos Açores e aos Açorianos, as quais, em vários casos, não entendemos, nem aceitámos.
Mas, por aqui, nestas nossas ilhas, também tivemos quem se tivesse assumido mais por “lá” do que por “cá”.
Contra toda a lógica e contra tudo o que se poderia esperar, houve quem tivesse defendido os cortes, a austeridade e o sufoco económico das famílias, das empresas e da economia.
Neste mesmo Parlamento, ouviram-se vozes a agourarem o fim da Autonomia, a criticarem um alegado condicionamento do Orçamento da Região e, até, a adivinharem o fim dos complementos remuneratórios e dos apoios sociais de que os Açorianos beneficiam e o despedimento de funcionários públicos.
Tudo isso a propósito do protocolo de entendimento entre os governos Regional e da República que pretendia, tão só, quantificar a participação dos Açores no esforço de consolidação orçamental e financeira do país.
Como devem estar envergonhados esses profetas da desgraça! E arrependidos também, sobretudo se se tiver em conta que, nesta Casa, o vento não leva as palavras – elas ficam registadas, estão em ata.
E convém, já agora, recordar que estão também na memória dos Açorianos.
E os Açorianos nunca se esquecerão disso.
Disse.”